Thursday, September 30, 2004

Assessor de Santana Ganha Mais do Que Presidente da República Por HELENA PEREIRA E CRISTINA FERREIRA

Público

Quinta-feira, 30 de Setembro de 2004

João Paulo Velez, assessor para a área da comunicação do primeiro-ministro, foi requisitado a uma agência de comunicação que trabalha para uma série de instituições privadas e públicas com interesses em sectores estratégicos da economia e para onde estão projectadas privatizações. Velez ganha quase o dobro de Pedro Santana Lopes e mais do que o Presidente da República. Segundo a Rádio Renascença, o seu vencimento ronda os dez mil euros. O ordenado base do primeiro-ministro situa-se nos 5173 euros, enquanto o do Presidente é de 6897 euros.

O salário de Velez é alto comparativamente com os dos titulares de cargos públicos porque este optou por continuar a receber de acordo com o lugar de origem, ou seja, a João Líbano Monteiro (JLM) e Associados. Esta sociedade presta assessoria de imagem e de comunicação a gestores empresas privados e públicos. Entre os seus clientes mais emblemáticos, estão a Galp Energia, a PT (entrou com a administração de Murteira Nabo e manteve-se com a actual), a Somague, desde que foi adquirida pelo grupo espanhol Sacyr, ou o Banco Totta, controlado pelo Santander. Em 2003, esteve associada ainda à EDP. Algumas destas empresas ou estão em fase de privatização ou projectam adquirir posições de controlo em áreas estratégicas, como a das águas. A espanhola Somague já revelou ter ambições em controlar este sector estratégico.

João Líbano Monteiro é conhecido por ser um homem de confiança do social-democrata Joaquim Ferreira do Amaral, presidente da comissão executiva (CEO) da Galp, a quem prestou assessoria quando este era ministro das Obras Públicas e durante sua a candidatura falhada à Presidência da República. Está também ligado ao actual ministro das Obras Públicas e ex-presidente executivo da Galp, António Mexia. A sua acção desenvolve-se em duas vertentes: directamente, através da empresa, ou indicando pessoas da sua confiança, que podem trabalhar ou não na JLM.

A João Líbano Monteiro e Associados já estava ligada a Pedro Santana Lopes, através da sua candidatura à Câmara de Lisboa em 2001. Isabel Athaíde Cordeiro, que pertencia à JLM, fez parte do "staff" da campanha autárquica de Lisboa de Santana. O agora primeiro-ministro ainda contou com a colaboração de Miguel Almeida Fernandes, da Unimagem, nos primeiros momentos da campanha, mas depois optou pela JLM. Isabel Athaíde Cordeiro desvinculou-se da JLM e está como assessora de Carmona Rodrigues na Câmara de Lisboa. Antes disto, tinha trabalhado na área da comunicação na Expo 98, tal como João Paulo Velez.

De acordo com a lei orgânica do gabinete do primeiro-ministro, datada de 1988 (era primeiro-ministro Cavaco Silva e ministro das Finanças Braga de Macedo), "os membros do gabinete que sejam membros das Forças Armadas, magistrados ou trabalhadores da administração central, regional ou local ou de institutos públicos e de quaisquer empresas gozam da faculdade de optarem pelas remunerações correspondentes aos cargos de origem, que serão suportadas pelo orçamento da Presidência do Conselho de Ministros". É essa legislação que Pedro Santana Lopes menciona no despacho de requisição de Velez, datado de 5 de Agosto, embora não mencione qual a entidade a que é requisitado o assessor.

Velez não comenta o seu salário, mas garantiu à Rádio Renascença que toda a sua situação profissional é legal.

Ao contrário do salário dos adjuntos, o dos assessores não está fixado em lei e pode ser negociado entre as partes, sem direito a subsídio para despesas de representação. Um membro do gabinete do primeiro-ministro disse ao PÚBLICO que é igual caso seja uma requisição a uma agência de comunicação como a um órgão de comunicação social ou a uma empresa pública e que Velez é pago pela Presidência do Conselho de Ministros. Existem no Governo mais casos de requisições como esta, tanto ao nível de assessores como de adjuntos. O assessor de imprensa da Presidência do Conselho de Ministros (PCM) afirmou ao PÚBLICO que o salário do assessor de Santana é pago pela PCM, mas que pode haver casos em que, "por razões de facilidade de processamento de ordenado", aquele pode ser adiantado pela entidade patronal de origem, que depois é reembolsada pelo Estado.

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