Monday, April 28, 2008

A quem interessa a avaliação como ficção?

A quem interessa a avaliação como ficção?

Paulo Guinote - 20080425 Público

O acordo possível entre ministério e professores não é um "entendimento", mas uma "trégua"
Este Governo e este Ministério da Educação acharam por bem erigir os docentes como seus adversários de estimação, decidindo serem eles os responsáveis pelos diversos males e maleitas que afectam a Nação, desde a escassa literacia por comparação com o resto da Europa até ao excessivo défice orçamental, medido pelos mesmos parâmetros.
O conflito vai em três anos e percorreu diversas matérias e assumiu variadas configurações. Uma das recorrências passou por um discurso pretensamente meritocrático, destinado a exaltar a necessidade da "excelência" na Educação e do "rigor" na avaliação dos docentes do sector público. Sendo para isso indispensável estabelecer um regime de avaliação que permitisse reconhecer o "mérito" e recompensá-lo em termos de diferenciação na progressão na carreira.
Se o objectivo fosse alcançar isso de forma rápida, havia solução fácil e cómoda. Recuperava-se o artigo 50.º do Estatuto da Carreira Docente de 1998, no qual se previa que "a atribuição da menção qualitativa de Muito Bom determina, para efeitos de progressão na carreira, a bonificação de dois anos no tempo de serviço do docente" e revia-se o Decreto Regulamentar n.º 11/98 onde se procedeu à regulamentação do processo de avaliação do desempenho, acrescentando-lhe o articulado então esquecido sobre essa menção qualitativa. O legislador podia introduzir todas as regras e normas que considerasse necessárias para distinguir o "mérito" ou a "excelência". Acredito mesmo que se nesse artigo surgisse um mecanismo próximo do das quotas, seria algo difícil aos sindicatos e aos docentes oporem-se a tal medida, antes implicitamente acordada, pois apenas viria colmatar uma lacuna na legislação existente.
O caminho seguido foi outro e revelador do verdadeiro projecto político deste Governo e deste ME em termos de gestão dos recursos humanos da Educação. As suas intenções nunca foram premiar o mérito ou a excelência, mas sim espartilhar horizontalmente a carreira docente e bloquear artificialmente a progressão da maioria dos seus elementos. A publicação do Decreto Regulamentar n.º 2/2008 em Janeiro deste ano apenas passou para verbo com valor legal um sistema de avaliação dos docentes destinado a legitimar esses mecanismos de bloqueio da progressão. Mais grave do que isso, foi um diploma marcado por dois outros pecados maiores, ao nível do conteúdo e da forma do modelo proposto:
- Em termos substanciais, todos percebemos, mesmo com vista fracamente armada, que se propunha um modelo profundamente burocrático, pesado, formalista, papelento e assente numa hierarquia de avaliadores que antes o ME afirmara (mesmo se injustamente) terem chegado ao topo da carreira apenas por efeito de um sistema indolente de promoção.
- Em termos formais, também era facilmente compreensível que, publicado com o ano lectivo a meio, o cronograma proposto era inexequível. O próprio ME confessou isso ao rapidamente prescindir de fazer a sua parte, adiando a avaliação dos professores-avaliadores pela IGE para as calendas.
O edifício começou a entrar em colapso pela própria cúpula.
Repetidamente humilhados em público, os professores sentiram-se justamente revoltados com a forma pouco respeitosa como estavam a ser tratados e protestaram. E protestaram como nunca o tinham feito até hoje. Em massa, de forma inesperada para muitos, independente e com um cuidado extremo em preservar a qualidade do seu trabalho nas escolas com os seus alunos, algo com que o ME não pareceu estar sempre muito preocupado com a sua forma de agir. Perante isso, entrámos numa rápida sucessão de manobras de ilusionismo, em que os recuos se chamaram progressos e as cedências se chamaram convergências.
Neste momento foi alcançado o acordo possível, baptizado de "entendimento", após o desacordo constante nos últimos anos. Eu chamar-lhe-ia antes a "trégua" possível, atendendo às circunstâncias. Como "trégua", não está mal. Mas sabendo-se que o debate e a contestação continuarão dentro de momentos.

Há que repensar a avaliação dos docentes de uma forma séria e não instrumental. A avaliação deve estar efectivamente ao serviço da qualidade da escola pública e não de interesses ideológicos, políticos ou económicos. Deve reconhecer o mérito dos profissionais no desempenho das funções, sem entraves artificiais. Deve ser feita com rigor, clareza e equidade.
Discordo do sistema de avaliação proposto pelo ME porque acho que ele assenta numa falsa ilusão positivista de objectividade que encobre alçapões de opacidade nos processos (secretismo na definição dos objectivos individuais) e de potencial clientelismo.
Acho que o processo de avaliação e classificação deveria ser público, ser formalizado no final de cada escalão da carreira e assentar, com naturalidade, na apresentação de uma prova pública de aptidão pedagógica perante um júri. Sei que não é uma opção muito popular e desejada por todos, mas é o método que acho mais adequado à função exercida.
Neste momento, tal como existe no Decreto Regulamentar n.º 2/2008, a avaliação dos docentes tornou-se uma ficção. Muito do que lá está é letra morta. Escuso-me de detalhar como, sem um diploma que o reveja ou substitua, qualquer avaliação "simplificada" é marginal à lei e, logo, impugnável em qualquer instância judicial.
Orgulhos pessoais e políticos afastados, aconselharia o bom senso que o modelo fosse rapidamente revisto de modo a torná-lo credível. Enquanto isso não acontecer, a avaliação dos docentes corre o risco de se tornar uma mera ficção legislativa.
Aparentemente, são muitos os que estão interessados nisso. Incluindo os que ontem defendiam este modelo como a quinta-essência da promoção do "mérito" e do "rigor", assim como do único caminho possível para a "excelência".
Professor do 2.º CEB, doutorado em História da Educação

Sunday, April 20, 2008

O INQUEBRANTÁVEL SENTIMENTO DO SR. SILVA

O INQUEBRANTÁVEL SENTIMENTO DO SR. SILVA


Fernanda Câncio
jornalista
fernanda.m.cancio@dn.pt
DN 19 de Abril 2008
É verdade o que José Miguel Júdice disse esta semana na SIC Notícias sobre Jardim: há décadas que os responsáveis políticos portugueses o tratam como se tratam os doidos, fazendo de conta que não o ouvem e nunca o contrariando. Aliás, não são só os responsáveis políticos. Basta não se ser madeirense ou, sendo, não viver na Madeira, para poder ignorar Jardim. E se um madeirense que vive na Madeira se queixa, a resposta está na ponta da língua: "Votam nele, não votam?"Certo que votam, há décadas, e sempre com maioria absoluta, não havendo notícia de quem acuse Jardim de manipular resultados. Terão pois o que merecem e nós, os outros portugueses, só damos por eles e por Jardim quando ele se lembra de insultar alguém "do Continente" ou desata num berreiro porque quer mais dinheiro ou ameaça não cumprir leis da República. Como alguns pedopsiquiatras dizem da má educação das crianças, será a forma de Jardim dizer "estou aqui".

Há, porém, um pequeno, minúsculo pormenor: nem todos os madeirenses votam em Jardim. Nas últimas eleições, em 2007, foram quase 40% dos recenseados a não votar nele. E dizem as regras da democracia que esses 40% têm, não só direito à vida, como a respeito, respeito esse devido aos seus representantes eleitos no Parlamento madeirense. Representantes que Jardim, igual a si próprio, faz gala em desrespeitar e insultar. Até aqui nada de novo. Novo é ter tido, ultimamente, apoios de peso nesse desrespeito: primeiro, o do presidente da Assembleia da República, o socialista Jaime Gama, que naquele mesmo Parlamento elogiou Jardim como "uma figura ímpar da democracia portuguesa" (se era para ser irónico, a ironia foi daquelas com necessidade de livro de instruções). E, esta semana, o do Presidente da República, que iniciou uma visita à Madeira após o anúncio, por parte de Jardim, de que não seria alvo de uma sessão solene no Parlamento Regional porque ele, Jardim, "tem vergonha daquele bando de loucos" (para Jardim os " loucos" são os deputados eleitos da oposição, bem entendido).

Há quem, como António Barreto, defenda que Cavaco, nestas circunstâncias, não devia ter ido; e quem, como Pacheco Pereira, considere que Cavaco devia ir para tornar bem claro a Jardim que por mais absolutas que sejam as suas maiorias o regime em vigor é a democracia, e o país no qual vive é Portugal. Não me contando entre os apoiantes de Cavaco nas eleições presidenciais, esperava do Presidente eleito o mesmo que Pacheco Pereira. Por um motivo muito simples: é o seu dever. Mas Cavaco achou que não. E não só aceitou a desfeita à democracia e a si próprio, assim a modos de um qualquer sr. Silva e não do representante supremo de Portugal, como chegou a, num discurso qualquer, referir-se ao "sentimento inquebrantável entre portugueses e madeirenses". Fez-se pois luz: Cavaco acha que a Madeira é o estrangeiro. Até se compreende, mas não se desculpa.|

Wednesday, April 16, 2008

Lembrem-se de Pirro

Santana Castilho - 20080416 Público

É verdade que os sindicatos ganharam uns trocos. Mas o lance era para devolução integral: da dignidade perdidaComecemos por uma questão semântica: entendimento e acordo são vocábulos sem diferenças, do ponto de vista da significação, que justifiquem o esforço da Plataforma Sindical para os distinguir. Vão a um bom dicionário. No contexto que "aproximou" sindicatos e ministério, são sinónimos. Mas se essa fosse a questão, então capitular dirimia o conflito. E não estou a ser irónico. Voltem a um bom dicionário.
Posto isto, passemos ao que importa. ministério e sindicatos acertaram, concertaram sob determinadas condições. No fim, os sindicatos cantaram vitória. Permitam-me que invoque alguns argumentos para desejar que os sindicatos não voltem a ter outra vitória como esta.
A actuação política deste Governo e desta ministra produziu diplomas (estatuto de carreira, avaliação do desempenho, gestão das escolas e estatuto do aluno) que envergonham aquisições civilizacionais mínimas da nossa sociedade. A rede propagandística que montaram procurou denegrir os professores por forma antes inimaginável. Cortar, vergar, fechar foram desígnios que os obcecaram. Reduziram salários e escravizaram com trabalho inútil. Burocratizaram criminosamente. Secaram o interior, fechando escolas aos milhares. Manipularam estatísticas. Abandalharam o ensino com a ânsia de diminuir o insucesso. Chamaram profissional a uma espécie de ensino cuja missão é reter na escola, a qualquer preço, os jovens que a abandonavam precocemente. Contrataram crianças para promover produtos inúteis. Aliciaram pais com a mistificação da escola a tempo inteiro ( que sociedade é esta em que os pais não têm tempo para estar com os filhos? Em que crianças passam 39 horas por semana encerradas numa escola e se aponta como progresso reproduzir o esquema no secundário, mas elevando a fasquia para as 50 horas?). Foram desumanos com professores nas vascas da morte e usaram e deitaram fora milhares de professores doentes (depois de garantir no Parlamento que não o fariam). Promoveram a maior iniquidade de que guardo recordação com o deplorável concurso de titulares. Enganaram miseravelmente os jovens candidatos a professores e avacalharam as instituições de ensino superior com a prova de acesso à profissão. Perseguiram. Chamaram a polícia. Incitaram e premiaram a bufaria. Desrespeitaram impunemente a lei que eles próprios produziram. Driblaram as leis fundamentais do país. Com grande despudor político, passaram sem mossa por sucessivas condenações em tribunais. Fizeram da imposição norma e desrespeitaram continuadamente a negociação sindical. Reduziram a metade os gastos com a Educação, por referência ao PIB. No que era essencial, no que aumentaria a qualidade do ensino, não tocaram, a não ser, uma vez mais, para cortar e diminuir a exigência e castrar o que faz pensar e questionar.
A questão que se põe é esta: por que razão esta gente, que tanto mal tem feito ao país e à Escola, que odeia os professores, que espezinhou qualquer discussão ou concertação séria, que sempre permaneceu irredutível na sua arrogância de quero, posso e mando, de repente, decidiu "aproximar-se" dos sindicatos? A resposta é evidente: porque os 100.000 professores na rua, a 8 de Março, provocaram danos. Porque a campanha eleitoral começou a reparar os estragos para garantir mais quatro anos.
O tempo e a oportunidade política da plataforma sindical aconselhava uma firmeza que claudicou. Porque quem estava em posição de impor contemporizou. Porque de um dia para o outro se esqueceram as exigências da véspera. Porque quem demandou a lei em tribunal pactuou com uma farsa legal. Porque quem acusou de chantagem acabou a negociar com o chantagista. Porque quem teve nos braços uma unidade de professores nunca vista pensou pouco sobre os riscos de a pôr em causa.
É verdade que os sindicatos ganharam uns trocos. Mas o lance não era para trocos. Era para devolução integral: da dignidade perdida.
Aqui chegados, permitam-me a achega: pior que isto é não serem capazes de superar isto. E lembrem-se de Pirro, quando agradeceu a felicitação pela vitória: " Mais uma vitória como esta e estou perdido". Professor do ensino superior


Saturday, April 12, 2008

Flávio contra Flândria

Flávio contra Flândria

Paulo Moura, Público 12 Abril 2008

Flávio foi o meu professor
primário. Isto passa-se antes do 25
de Abril, bem entendido (ver foto
acima).
Na minha sala havia uns 40
alunos. Todos rapazes, porque a
escola não era mista. Nas fi las da
frente, sentavam-se os fi lhos das
famílias mais ricas, ou de classe
média. Atrás, numa zona que o
próprio Flávio baptizara como “a
fi la dos burros”, encolhiam-se de
puro medo os meninos que, por
uma curiosa coincidência, andavam
descalços.
O professor Flávio passeava-se por
entre as carteiras com uma cana-daÍndia
na mão. Ia fazendo perguntas,
para o ar, sem destinatário. Em
silêncio, nós, paralisados pelo
terror, esperávamos que ele,
no fi m da pergunta, se voltasse
subitamente para um: “Paulo!” O
aluno respondia, quase sempre mal,
porque o pânico tolhe o raciocínio. E
zás!, a vara caía-lhe com toda a força
sobre uma orelha. Passávamos horas
nisto. Era um dos prazeres de Flávio.
Outro era fazer a chamada para
entregar os ditados. Quantos erros
tínhamos dado, quantas reguadas
levávamos. Claro que os gloriosos
elementos da “fi la dos burros”
davam muito mais erros do que os
outros, e portanto apanhavam mais.
A vida deles era, aliás, apanhar.
Em geral, conformavam-se. Se lhes
tinha calhado na rifa serem pobres
e “burros”, também era normal que
apanhassem. Era a lei da vida. Pelo
menos naquela altura, era.
Apanhavam e calavam. Não. Um
deles era diferente. Chamávamoslhe
o Flândria, porque o pai
trabalhava como operário na
fábrica de motorizadas Flândria.
Era um miúdo baixito, de cabelo
quase rapado, calças rotas,
sempre descalço. Era um “burro”
normal, mas um dia fez uma coisa
extraordinária: quando a cana
descia brutalmente sobre a sua
cabeça, ele agarrou-a, puxou-a, e
perante o estarrecimento da turma
inteira, deu um encontrão ao
Flávio. Louco de fúria, o professor
agarrou-o pelos colarinhos e
começou a dar-lhe bofetadas e
pontapés.
O Flândria desatou a chorar, mas
Flávio não se condoeu. Continuou
a bater-lhe com os pés e as mãos,
muito vermelho, a suar em bica. O
Flândria levantou-se e fugiu, mas
o Flávio foi atrás dele. Ficámos
a assistir a uma perseguição
tresloucada por entre as carteiras.
A dado momento, o Flândria teve
uma jogada de génio: empurrou
uma cadeira para o meio do
corredor. O professor, que vinha
atrás, tropeçou e estatelou-se no
chão. Foi maravilhoso, mas ninguém
ousou rir-se. Quando Flávio se
levantou, o Flândria percebeu que
tinha de fugir porta fora.
O professor recompôs-se e
continuou a aula, como se nada
se tivesse passado. Nenhum de
nós abriu a boca. Excepto, claro,
o Flândria, que entretanto tinha
enfi ado a cabeça pela janela e
gritava, lá de fora: “Quero as minhas
coisinhas!” Referia-se à sua pasta
imunda, que não conseguira levar
consigo, na precipitação da fuga.
“Quero as minhas coisinhas!”,
chorava ele, pendurado na janela.
Mas nenhum de nós ousou sequer
voltar a cabeça.
Flândria, onde quer que estejas,
quero que saibas isto: durante toda a
vida, foste o meu herói.
Jornalista

Para onde vai o trabalho humano

Para onde vai o trabalho humano

João Fraga de Oliveira - 20080412 Público

Parte do trabalho "desaparece" no interior das empresas, através do trabalho clandestino e estágios não remunerados

Elísio Estanque perguntava neste jornal, no dia 2 de Fevereiro: "O que está a mudar no trabalho humano?" E respondia, identificando e caracterizando as principais mudanças que se vêm a verificar no mundo do trabalho, bem como as consequências mais relevantes dessas mudanças, do ponto de vista económico, social e humano. Reflectindo sobre esse excelente artigo, coloco-me a mim próprio a pertinência de outra pergunta que considero intimamente relacionada com a formulada por Elísio Estanque e que, aliás, há 50 anos, foi já expressa, por Georges Friedman: para onde vai o trabalho humano? Para onde vai o trabalho que tantos procuram (re)encontrar e que tanto desaparece?
Vai, é certo, para o exterior. Para o exterior do país e da própria União Europeia, por exemplo, através das "deslocalizações da produção" (estão na ordem do dia os recentes despedimentos colectivos nas empresas Delphi e Yazaki Saltano), para países de outros continentes, ou, por uma forma mais individualizada, através do teletrabalho intercontinental. Mas vai também para o interior.
Para o interior da União Europeia, através da emigração (que, em Portugal, tem vindo, de novo, a crescer) e do destacamento de trabalhadores (como tem sido o caso da construção civil).
Para o interior do país, através das cadeias de sub (sub, sub...) contratação e trabalho temporário, em que, clandestinamente, muito trabalho "desaparece". Para o interior das empresas (e da própria administração pública), onde "desaparece" através do trabalho clandestino (sobretudo, o suplementar, para além do horário de trabalho), dos "estágios" não remunerados (de que já há descaradas ofertas nos jornais), dos falsos "recibos verdes", dos biscates, etc.
Mas o que é, talvez, mais perverso é que esse trabalho que "desaparece", afinal, vai também, através da sua (sobre)intensificação e degradação das condições em que é exercido, para o interior das pessoas. Desde logo, porque, quando há rescisões ou cessações do contrato de trabalho, os trabalhadores vêm para o "exterior" (para o desemprego, para a reforma ou para a aposentação) mas, no "interior" das organizações des/empregadoras - não sendo, em regra, esses trabalhadores substituídos oportunamente ­-, o trabalho, realmente, fica lá todo. Só que "desaparece", para o "interior" dos trabalhadores que restaram, os quais, muitas vezes, em decurso de uma (des)organização de trabalho e de modelos de gestão em que impera a "competitividade" a todo o custo (incluindo o da condição humana), o têm que passar a realizar em condições de (sobre)intensificação física ou mental.
Depois, porque essa sobreintensificação do trabalho é, em muito, fomentada e alimentada pelo desemprego (como instrumento de chantagem e de amedrontamento) que "está cá fora" e, "lá dentro", pela condição de precariedade (à qual, sendo uma espécie de subemprego, corresponde, em regra, sobretrabalho) em que esses trabalhadores frequentemente estão.
Desta forma, o trabalho "desaparece" para o "interior" (para o âmago) das pessoas (e das suas famílias), no sentido, dramático, das nefastas consequências que tal implica, do ponto de vista de saúde física e mental e condição social, de que são exemplos, como associados à sobrecarga física ou psicológica relacionada com o trabalho, o crescimento epidemiológico das doenças e lesões músculo-esqueléticas, o stress, o burnout, o assédio moral, a violência, o suicídio, mesmo.
Enganam-se, julgo eu, os teóricos do "fim do trabalho" através da robotização e da automatização, partindo de um conceito mecanicista do trabalho e das "profundas mudanças" tecnológicas e gestionárias que estão em curso.
É que, julgo eu ainda, o trabalho, mais do que um conceito abstracto (jurídico, sociológico, filosófico, etc.) ou técnico-tecnológico, é um conceito essencialmente humano e, consequentemente, social. O trabalho, realmente, consubstancia-se nas pessoas que trabalham.
É por isso que, quando o trabalho aparece, é essencialmente das pessoas que trabalham que ele "vem". E, também, quando ele "desaparece", em última análise e em todos os sentidos, é também para as pessoas que trabalha(ra)m que o trabalho "vai". Ainda que não sejam estas as que com ele lucram. Licenciado em Gestão de Recursos Humanos e Psicologia do Trabalho e funcionário público.


O telemóvel

O telemóvel

José Pacheco Pereira - 20080412 Público

O objecto que mais mudou os nossos hábitos sociais não é o computador, nem a Internet, nem o cabo, é o telemóvelUm telemóvel esteve no centro do momento público mais dramático da educação portuguesa nos últimos tempos. Uma semana antes do telemóvel, foi uma manifestação de professores. Uma semana depois da manifestação, uma senhora magra e baixa de gabardina branca, pequena e frágil, a lutar contra uma adolescente gigante, feita de cereais matinais e vestida de escuro. Na mão das duas, agarrado pelas duas, está um objecto que não existia há dez anos, um telemóvel pequeno que cabe num bolso dumas calças de ganga. No episódio a que me refiro, e que passou na televisão centenas e centenas de vezes, não há um, mas dois telemóveis, um que está no centro da luta, outro que filma. À volta do telemóvel que filma está uma turma do ensino secundário, está uma escola da cidade do Porto, está Portugal, está a Europa, está o mundo inteiro. Está o YouTube.
O pequeno objecto é o mais ubíquo de todos os objectos que existem hoje em Portugal, mais visível do que outro objecto tão omnipresente como o telemóvel e tão subversivo socialmente como o telemóvel: o relógio de pulso. Telemóvel e relógio são instrumentos de poderosas transformações sociais que eles revelam tanto como potenciam. Não são eles por si só que produzem essas transformações, porque nenhuma tecnologia por muito nova e revolucionária exerce efeitos sociais sem a "sociedade" estar preparada para a usar, sem que corresponda ao tempo e ao modo, à forma, às correntes de mudança da sociedade que já estão em curso e "descobrem" o objecto acelerando o seu curso com ele.
É o caso do relógio que saiu do laboratório das excentricidades, um pouco como precursor de um Meccano ou um Lego moderno, ou de um jogo de habilidade mecânica, ou de um objecto de luxo tão curioso como inútil, para se transformar numa necessidade tão vital que biliões de homens o trazem no pulso. Se exceptuarmos o uso dos relógios nos navios para calcular a longitude, os relógios não serviam para nada quando a esmagadora maioria das pessoas trabalhava de sol a sol, ou ao ciclo das estações, e estas dependiam de um calendário que estava escrito nos astros. Calendários eram precisos, relógios não eram precisos, até ao momento em que a Revolução Industrial apareceu e mudou quase tudo por onde passou. Milhões de pessoas vieram dos campos para as cidades, para as fábricas e para as minas, e precisavam de horas. O relógio subiu primeiro para as torres ou para o centro da fachada neoclássica das fábricas e lá continuou, passando depois para dentro, e depois para o bolso dos ricos e por fim para o pulso de todos. Hoje o relógio ordena o nosso tempo com um rigor muito para além do biológico e manda no nosso corpo, como nenhum objecto do passado. É tão presente que parece invisível, nem damos por ela que está lá, é parte do nosso corpo, mais do que objecto estranho. Um figurante do Ben Hur esqueceu-se dele, e nos filmes há quem vá para a cama sem ser para dormir, só vestido no pulso.
O telemóvel é o objecto que mais mudou os nossos hábitos sociais desde que existe. Não é o computador, nem a Internet, nem o cabo, é o telemóvel. E continua a mudar sem darmos muito por isso, porque a mudança se faz de forma desigual, quer no que muda, quer em quem muda. Dito de outra maneira, muda certas coisas nos jovens e muda outras nos adultos e os seus efeitos estão longe de ter terminado ou sequer de se saber até que ponto de transformação vão. Uma coisa é certa, o telemóvel, ou seja um instrumento de contacto instantâneo e portátil entre mim e todos e todos e mim, que usa predominantemente a voz e, daqui a poucos anos, usará a voz e a imagem, emigrará para ainda mais perto de mim, para a minha roupa, para os meus ouvidos, como já emigrou para as paredes do meu carro. O que ele transporta não é uma ficção, não é um avatar ou um nick mais ou menos anónimo, não é a minha prefiguração virtual como no Second Life ou nas caixas de comentários ou nos blogues anónimos, é a minha voz, a minha imagem, ou seja, eu. Não seria tão poderoso se fosse um instrumento do meu teatro virtual. Bem pelo contrário, é uma encarnação da minha persona, é o meu lugar na sociabilidade dos outros.
Por isso, luta-se por um telemóvel, porque num telemóvel de um adolescente está muito do seu mundo: telefones dos amigos, telefone dos namorados, passwords, fotografias, mensagens, vídeos, o equivalente a um diário pessoal, em muitos casos mais íntimo que um diário à antiga, com a sua chavinha de brincar que dava a ilusão de que ninguém o lia. À medida que se caminha pela idade acima o conteúdo do telemóvel muda, mas continua pessoal e intransmissível, com os SMS comprometedores que arruínam muitos casamentos, até se tornar quase um telefone de emergência que os filhos dão aos pais com os números deles já gravados e os das emergências: "é só carregar aqui e eu atendo, se houver qualquer problema, assim não se sente sozinho." Sente.

Mas as mudanças não se ficam por aqui. Já escrevi sobre algumas, como a presentificação obrigatória, a obrigação socialmente exigida de se estar sempre presente, porque o corpo e o telemóvel vão juntos. Deixou de se poder estar longe de um telefone, já para não dizer que se deixou de poder não ter telemóvel. A recusa de dar um número de telemóvel é tida como uma má educação ou uma insensata e insociável vontade de não estar disponível. Com o telemóvel está-se sempre disponível, ficam sempre os recados, queira-se ou não recebê-los, e o novo código do telemóvel exige que haja sempre resposta. Por que razão tenho eu que receber recados que não solicitei, e dar respostas que posso não ter tempo ou disponibilidade ou vontade para dar? Não posso, porque a máquina não aceita um não por resposta, ela vive do tráfego, e deseja mais tráfego. Por isso oferece-me voice-mail, e-mail no telemóvel, mensagens, sem eu o pedir.
Nos mais jovens o telemóvel é apenas mais um instrumento para a completa insensibilidade à perda de privacidade e intimidade. Crescendo num mundo que não preza e não educa para esses valores, um mundo que incentiva a exposição pública, o telemóvel fornece um meio de registo, incorporando a máquina fotográfica e o vídeo, no qual qualquer fronteira entre o que é público e privado se esbate. Qualquer um é um paparazzi de si próprio e dos outros e o rapaz que filmou o vídeo em glória do 9.º C da escola Carolina Michaëlis estava a pensar nessa dimensão lúdica e social do YouTube onde a vã glória de maltratar uma professora ou de uma fight na turma iriam dar fama na rede de chats e no Hi5 onde milhares de raparigas, adolescentes ou já nem tanto, se mostram em poses provocadoras, já para não falar no resto. Não sei se quando crescerem se vão arrepender, mas então já será tarde, porque uma vez na rede sempre na rede.
Por último há o controlo, o magnífico instrumento de controlo que é o telemóvel, pessoa a pessoa, numa rede que prende os indivíduos numa impossível fuga àquilo que é o objecto sempre presente, sempre ligado (os telemóveis desligados são de desconfiar), no qual a primeira pergunta é sempre "onde tu estás?", uma pergunta sem sentido no telefone fixo, esse anacronismo. Adolescentes jovens ou tardios, casais, maridos, mulheres, amantes, namorados, patrões e empregados, jogam todos os dias esse jogo do controlo muito mais importante do que a necessidade de falar ao telemóvel. Na verdade a esmagadora maioria das chamadas de telemóvel não tem qualquer objecto ou necessidade de ser feita, ninguém as faria num mundo de telefones fixos, que não seja pelo controlo, pela presentificação do indivíduo no seu jogo de inseguranças, solidões, afectos, e medos, através da caixa electrónica que se segura numa mão.
Não é a necessidade que justifica a presença quase universal dos telemóveis desde as crianças de seis anos até aos velhos, os milhões de chamadas a qualquer hora do dia, em qualquer sítio, da missa à sala de aulas, do carro à cama, é o complexo jogo de interacções sociais que ele permite, sem as quais já não sabemos viver. Viver num mundo muito diferente e cada vez mais diferente. Historiador

Friday, April 11, 2008

Telemóveis na sala de aula

Telemóveis na sala de aula

Bernardo Moura - 20080410 Público

Haverá razão para fazer uma distinção tão categórica entre o telemóvel e tudo o resto que nos pode distrair Com frequência e quase com unanimidade, tem-se assistido nas últimas semanas à defesa da proibição de entrada dos telemóveis na sala de aula. É um fenómeno interessante e revelador de várias latências.
Em primeiro lugar, os motivos para ter de deixar o telemóvel no cacifo ou bem desligado no fundo da mochila. Os telemóveis são, de facto, instrumentos de distracção, que possibilitam, aliás, várias escolhas para o alheamento (SMS, jogos, música, etc.). Sim, são potencialmente o objecto mais recreativo que transportamos no dia-a-dia. Mas será razão para fazer uma distinção tão categórica relativamente a tudo o resto que nos pode distrair numa sala de aula? Não se distraem e sempre distraíram os alunos com tudo e mais alguma coisa, nem que seja o/a colega giríssimo/a da carteira ao lado? A chave para a distracção está no próprio aluno e naquele que tem como função cativar o seu interesse: o professor. O tratamento diferencial dado ao telemóvel (e não só, como veremos) parece-me estar provavelmente relacionado com algo menos óbvio: o próprio ódio que temos à tecnologia.
Desde sempre o ser humano desenvolveu tecnologias que simultaneamente participam também na nossa própria construção e assim sucessivamente. O homem e a máquina são duas entidades que rivalizam e travam um duelo. Os telemóveis, criação recente, são uma das incorporações tecnológicas mais poderosas. Não podemos passar sem eles, mas no fundo detestamo-los. Exemplificando, não será a autocrítica gerada pelos estudos que mostram que somos dos países da Europa com mais telemóveis per capita um sinal desse ódio?
Nas escolas, foi encontrado um campo seguro para fazer a discriminação deste objecto tecnológico. Porquê nas escolas? Porque o ambiente escolar e a pedagogia são terrenos elevados ao patamar do sagrado.
A educação e as maneiras como ela é transmitida é dos mecanismos mais conservadoramente preservados nas sociedades. É pela educação que moldamos a sociedade futura, portanto quando definimos como e o que ensinar estamos a fazer a projecção das nossas expectativas mais profundas sobre a humanidade. E essas ideias são emanadas da nossa autocrítica, da avaliação que fazemos dos nossos pecados sociais e vícios, sendo, portanto, um terreno fértil para que cresça um certo puritanismo.
As ideias tal como aparecem nos livros de escola vêm limpas, translúcidas e por isso tantas vezes tão enganadoras. Assim, é deste ambiente asséptico proclamado pela pedagogia que vem a nossa motivação para reprimir a tecnologia nas salas de aula. É na escola, esse bastião da Humanidade, que vamos trucidar livremente esses pequenos objectos digitais para assim desprendermos as nossas energias reprimidas. É onde ainda sonhamos com uma sociedade regenerada, livre de sacrilégios, da qual nos orgulhamos. Podemos também olhar para outros aparelhos. Quanto tempo demorou o computador a entrar com expressão nas escolas? Muito. Nas salas de aula ainda não entrou verdadeiramente. Nas escolas, a Internet é considerada, ainda que muitas vezes inconscientemente, uma invenção malévola, o instrumento que possibilita a cópia mais rápida e mais perfeita aos alunos, corrompendo-os. Não é de admirar que no en-
sino superior, onde há uma aproximação bastante mais livre à pedagogia, as máquinas tecnológicas tenham proliferado cedo.
A velocidade com que a nova sociedade tecnológica da informação vai crescendo e a mudança que provoca no modo de pensar e agir das novas gerações contrasta com o paradigma conservador da pedagogia. São precisas mudanças fundamentais que criem uma dinâmica mais arrojada no sistema de ensino. Para isso teremos de repensar as nossas concepções mais profundas sobre a sociedade que desejamos. Será que o nosso orgulho o permitirá? Estudante

Wednesday, April 09, 2008

ONDE PÁRA O MINISTRO MARIANO GAGO?

A FORÇA DE ESTARMOS UNIDOS

(clique aqui)

ONDE PÁRA O MINISTRO MARIANO GAGO?

Desapareceu da nossa vista sem cumprir os calendários que ele próprio se comprometeu o “nosso” Ministro Mariano Gago: nem tem sido visto e politicamente está ausente desde a publicação do RJIES… há 6 meses! Em Julho passado, mais uma vez, depois de outros adiamentos, o Ministro, “aliviado” com a conclusão final desse RJIES, prometeu para Setembro de 2007 a divulgação das linhas gerais das revisões dos estatutos de carreiras e até hoje este compromisso continua por cumprir!

Mas este não é o único “atraso” deste Ministro, face às datas e calendários que ele próprio se comprometeu:

1. O PRACE, anunciado em Março de 2006, reorganizou os órgãos consultivos do MCTES, criando os Conselhos Coordenadores da Ciência e Tecnologia, e do Ensino Superior, que demoraram 7 meses para serem vertidos na lei orgânica do mesmo Ministério, em Outubro de 2006… e ambos aguardam a publicação da respectiva lei orgânica há 17 meses!

Sendo estes 2 dos 3 órgãos consultivos do MCTES – o 3º sendo o Conselho Nacional de Educação, que não foi muito “ouvido” pelo Ministro (como também não pela Ministra da Educação!) -, deverá depreender-se que o Ministro não necessita de conselhos, nem de consultar ninguém? Ou que o MCTES terá uma versão mais “caseira” destes Conselhos, mas que não esta “legalizada” por qualquer lei orgânica?

2. Os Colégios de Especialidade foram criados em Agosto de 1996… e nunca regulamentados desde então, há quase 12 anos! Não se sabe se o Ministro Mariano Gago não pretende dar sequência à legislação dessa altura, da autoria do Ministro da Ciência e Tecnologia, por coincidência tutelado pela mesma personagem, mas os investigadores continuam a aguardar…

3. O próprio RJIES tem já 6 meses… e continuam por regular por lei especial:

- A acreditação e avaliação das instituições e dos ciclos de estudos (a Agência respectiva foi criada há 4 meses… mas continua a ser o Governo, através da Direcção Geral do Ensino Superior, a acreditar os cursos!

- As condições de atribuição do título de “especialista” (aqui nem se vislumbra qualquer fumo de ideia…)

- O regime e carreiras do pessoal docente e investigador das instituições públicas

- O regime do pessoal docente das instituições privadas

- O diploma regulamentar do procedimento de reconhecimento de interesse público dos estabelecimentos de ensino superior privados.

Necessitamos de um interlocutor para ouvir as nossas preocupações e negociar as soluções dos nossos problemas. Ignoramos se, na última remodelação, se esqueceram de referenciar este “desaparecimento”… ou se houve um problema de deliquescência do Ministro no Governo, mas já há muito que ignoramos o seu paradeiro e até já estamos a ficar com “saudades”.

Quando se dignará lembrar-se de que os docentes do ensino superior e os investigadores existem e têm problemas para resolver?

Departamento do Ensino Superior e da Investigação

Wednesday, April 02, 2008

O sistema

O sistema

Santana Castilho - 20080402

Para quem se interroga sobre o verdadeiro conceito de "eduquês", aqui está [no Acção Socialista] um belo paradigmaOs acontecimentos da Carolina Michaëlis foram analisados sob os mais diversos ângulos. Ouvi os disparates do costume, teses controversas e complexas arrancadas às entranhas das ortodoxias pedagógicas, psicológicas e sociológicas, de que discordo, e opiniões alicerçadas no simples bom senso dos que procuram civilizar (entenda-se civilizar como preparar para a vida civil, imbuir os mais novos de civismo).
Assente o pó, a lógica de Lampedusa (é preciso que algo mude para que tudo fique na mesma) continuará a sua marcha. Porque o problema da Escola é, como no futebol, o sistema. O sistema que impera há décadas e que tem excluído os professores da sala de aula (expressão feliz de Mithá Ribeiro) das decisões congeminadas por elites de teóricos que não sabem o que é uma escola. E porque desta feita o mote foi o telemóvel, transcrevo uma pérola ilustrativa, extraída de um artigo de Carlos Zorrinho, coordenador nacional da Estratégia de Lisboa e do Plano Tecnológico. Vem no Acção Socialista de 18 de Março e doutrina assim:
"... A vida é hoje cada vez mais multifuncional. Ao mesmo tempo vemos televisão, lemos, escrevemos, jogamos e falamos! É isso que os jovens estudantes fazem quando estudam com a música alta, o computador ligado e o telemóvel pronto a trocar mensagens. É assim que aprendem e é nesse ambiente que vão criar valor.
E a escola? A escola é cada vez mais isso nos intervalos, nas actividades lúdicas e complementares, mas não tem ainda condições para ser isso nos períodos formais de aulas..."
Ouviram bem? À vez, vemos televisão, lemos, escrevemos, jogamos e falamos. E esta balbúrdia, depreendo eu do que li, é o modelo desejado para a escola pelo professor universitário que coordena a Estratégia de Lisboa e o Plano Tecnológico. Para quem se interroga sobre o verdadeiro conceito de "eduquês", aqui está um belo paradigma. O "eduquês" é a linguagem do sistema, entendido este como um pacto entre elites dominantes de académicos que abominam ensinar, de políticos incompetentes e burocratas de serviço.
Os acontecimentos da Carolina Michaëlis, a dar fé à imprensa, chocaram também Cavaco Silva, que resolveu convocar o procurador-geral da República. Foi a última iniciativa de uma série que "judicializou" um acontecimento lamentável (a vários títulos, que não só o do comportamento da aluna e colegas), mas que é de natureza estritamente disciplinar e escolar. Pena foi que o Presidente da República não se tenha chocado mais cedo com tantas iniciativas que, por acção ou omissão, promoveu e ajudaram a robustecer o sistema. Por todas, e como mero exemplo, lembro esse monumento ao "eduquês" (Lei nº23/2006, de 23 de Junho), que promulgou sem pestanejar. Segundo tal diploma legal, e cito o que na altura aqui escrevi, um grupo de jovens de seis anos de idade, seis, pode constituir-se em associação de estudantes. Se o fizer, tem direito a apoio financeiro, técnico, formativo e logístico por parte do Estado. Tem direito a tempo de antena no serviço público de rádio e de televisão. O Estado deverá remeter a esse grupo de jovens todos os projectos de actos legislativos que se refiram à definição, planeamento e financiamento do sistema educativo, à gestão das escolas, ao acesso ao ensino superior, à acção social escolar e aos planos de estudos, reestruturação e criação de novos agrupamentos e áreas curriculares ou disciplinas, para que eles emitam sobre o mesmo o seu parecer. Para além da audição obrigatória por parte do Estado, como referido, estes jovens de seis anos ainda têm o direito de ser consultados pelos órgãos de gestão das escolas que frequentem, quanto às seguintes matérias: projecto educativo da escola; regulamentos internos; planos de actividades e orçamento; projectos de combate ao insucesso escolar; avaliação; acção social escolar; organização de actividades de complemento curricular e do desporto escolar.
Querem melhor para voltar à Carolina Michaëlis? Para desviar os holofotes do que estava em marcha, isto é, a primeira contestação dos professores capaz de fazer mossa ao sistema? Professor do ensino superior

What Makes Finnish Kids So Smart?

What Makes Finnish Kids So Smart?

Finland's teens score extraordinarily high on an international test. American educators are trying to figure out why.
By ELLEN GAMERMAN
February 29, 2008; Page W1

Helsinki, Finland

High-school students here rarely get more than a half-hour of homework a night. They have no school uniforms, no honor societies, no valedictorians, no tardy bells and no classes for the gifted. There is little standardized testing, few parents agonize over college and kids don't start school until age 7.

Yet by one international measure, Finnish teenagers are among the smartest in the world. They earned some of the top scores by 15-year-old students who were tested in 57 countries. American teens finished among the world's C students even as U.S. educators piled on more homework, standards and rules. Finnish youth, like their U.S. counterparts, also waste hours online. They dye their hair, love sarcasm and listen to rap and heavy metal. But by ninth grade they're way ahead in math, science and reading -- on track to keeping Finns among the world's most productive workers.

Finland's students are the brightest in the world, according to an international test. Teachers say extra playtime is one reason for the students' success. WSJ's Ellen Gamerman reports.

The Finns won attention with their performances in triennial tests sponsored by the Organization for Economic Cooperation and Development, a group funded by 30 countries that monitors social and economic trends. In the most recent test, which focused on science, Finland's students placed first in science and near the top in math and reading, according to results released late last year. An unofficial tally of Finland's combined scores puts it in first place overall, says Andreas Schleicher, who directs the OECD's test, known as the Programme for International Student Assessment, or PISA. The U.S. placed in the middle of the pack in math and science; its reading scores were tossed because of a glitch. About 400,000 students around the world answered multiple-choice questions and essays on the test that measured critical thinking and the application of knowledge. A typical subject: Discuss the artistic value of graffiti.

The academic prowess of Finland's students has lured educators from more than 50 countries in recent years to learn the country's secret, including an official from the U.S. Department of Education. What they find is simple but not easy: well-trained teachers and responsible children. Early on, kids do a lot without adults hovering. And teachers create lessons to fit their students. "We don't have oil or other riches. Knowledge is the thing Finnish people have," says Hannele Frantsi, a school principal.

Visitors and teacher trainees can peek at how it's done from a viewing balcony perched over a classroom at the Norssi School in Jyväskylä, a city in central Finland. What they see is a relaxed, back-to-basics approach. The school, which is a model campus, has no sports teams, marching bands or prom.

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Fanny Salo in class

Trailing 15-year-old Fanny Salo at Norssi gives a glimpse of the no-frills curriculum. Fanny is a bubbly ninth-grader who loves "Gossip Girl" books, the TV show "Desperate Housewives" and digging through the clothing racks at H&M stores with her friends.

Fanny earns straight A's, and with no gifted classes she sometimes doodles in her journal while waiting for others to catch up. She often helps lagging classmates. "It's fun to have time to relax a little in the middle of class," Fanny says. Finnish educators believe they get better overall results by concentrating on weaker students rather than by pushing gifted students ahead of everyone else. The idea is that bright students can help average ones without harming their own progress.

At lunch, Fanny and her friends leave campus to buy salmiakki, a salty licorice. They return for physics, where class starts when everyone quiets down. Teachers and students address each other by first names. About the only classroom rules are no cellphones, no iPods and no hats.

TESTING AROUND THE GLOBE
[FinnPromo]
Every three years, 15-year-olds in 57 countries around the world take a test called the Pisa exam, which measures proficiency in math, science and reading.
The test: Two sections from the Pisa science test
Chart: Recent scores for participating countries
DISCUSS
Do you think any of these Finnish methods would work in U.S. schools? What would you change -- if anything -- about the U.S. school system, and the responsibilities that teachers, parents and students are given? Share your thoughts.

Fanny's more rebellious classmates dye their blond hair black or sport pink dreadlocks. Others wear tank tops and stilettos to look tough in the chilly climate. Tanning lotions are popular in one clique. Teens sift by style, including "fruittari," or preppies; "hoppari," or hip-hop, or the confounding "fruittari-hoppari," which fuses both. Ask an obvious question and you may hear "KVG," short for "Check it on Google, you idiot." Heavy-metal fans listen to Nightwish, a Finnish band, and teens socialize online at irc-galleria.net.

The Norssi School is run like a teaching hospital, with about 800 teacher trainees each year. Graduate students work with kids while instructors evaluate from the sidelines. Teachers must hold master's degrees, and the profession is highly competitive: More than 40 people may apply for a single job. Their salaries are similar to those of U.S. teachers, but they generally have more freedom.

Finnish teachers pick books and customize lessons as they shape students to national standards. "In most countries, education feels like a car factory. In Finland, the teachers are the entrepreneurs," says Mr. Schleicher, of the Paris-based OECD, which began the international student test in 2000.

One explanation for the Finns' success is their love of reading. Parents of newborns receive a government-paid gift pack that includes a picture book. Some libraries are attached to shopping malls, and a book bus travels to more remote neighborhoods like a Good Humor truck.

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Ymmersta school principal Hannele Frantsi

Finland shares its language with no other country, and even the most popular English-language books are translated here long after they are first published. Many children struggled to read the last Harry Potter book in English because they feared they would hear about the ending before it arrived in Finnish. Movies and TV shows have Finnish subtitles instead of dubbing. One college student says she became a fast reader as a child because she was hooked on the 1990s show "Beverly Hills, 90210."

In November, a U.S. delegation visited, hoping to learn how Scandinavian educators used technology. Officials from the Education Department, the National Education Association and the American Association of School Librarians saw Finnish teachers with chalkboards instead of whiteboards, and lessons shown on overhead projectors instead of PowerPoint. Keith Krueger was less impressed by the technology than by the good teaching he saw. "You kind of wonder how could our country get to that?" says Mr. Krueger, CEO of the Consortium for School Networking, an association of school technology officers that organized the trip.

Finnish high-school senior Elina Lamponen saw the differences firsthand. She spent a year at Colon High School in Colon, Mich., where strict rules didn't translate into tougher lessons or dedicated students, Ms. Lamponen says. She would ask students whether they did their homework. They would reply: " 'Nah. So what'd you do last night?'" she recalls. History tests were often multiple choice. The rare essay question, she says, allowed very little space in which to write. In-class projects were largely "glue this to the poster for an hour," she says. Her Finnish high school forced Ms. Lamponen, a spiky-haired 19-year-old, to repeat the year when she returned.

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At the Norssi School in Jyväskylä, school principal Helena Muilu

Lloyd Kirby, superintendent of Colon Community Schools in southern Michigan, says foreign students are told to ask for extra work if they find classes too easy. He says he is trying to make his schools more rigorous by asking parents to demand more from their children.

Despite the apparent simplicity of Finnish education, it would be tough to replicate in the U.S. With a largely homogeneous population, teachers have few students who don't speak Finnish. In the U.S., about 8% of students are learning English, according to the Education Department. There are fewer disparities in education and income levels among Finns. Finland separates students for the last three years of high school based on grades; 53% go to high school and the rest enter vocational school. (All 15-year-old students took the PISA test.) Finland has a high-school dropout rate of about 4% -- or 10% at vocational schools -- compared with roughly 25% in the U.S., according to their respective education departments.

Another difference is financial. Each school year, the U.S. spends an average of $8,700 per student, while the Finns spend $7,500. Finland's high-tax government provides roughly equal per-pupil funding, unlike the disparities between Beverly Hills public schools, for example, and schools in poorer districts. The gap between Finland's best- and worst-performing schools was the smallest of any country in the PISA testing. The U.S. ranks about average.

Finnish students have little angstata -- or teen angst -- about getting into the best university, and no worries about paying for it. College is free. There is competition for college based on academic specialties -- medical school, for instance. But even the best universities don't have the elite status of a Harvard.

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Students at the Ymmersta School near Helsinki

Taking away the competition of getting into the "right schools" allows Finnish children to enjoy a less-pressured childhood. While many U.S. parents worry about enrolling their toddlers in academically oriented preschools, the Finns don't begin school until age 7, a year later than most U.S. first-graders.

Once school starts, the Finns are more self-reliant. While some U.S. parents fuss over accompanying their children to and from school, and arrange every play date and outing, young Finns do much more on their own. At the Ymmersta School in a nearby Helsinki suburb, some first-grade students trudge to school through a stand of evergreens in near darkness. At lunch, they pick out their own meals, which all schools give free, and carry the trays to lunch tables. There is no Internet filter in the school library. They can walk in their socks during class, but at home even the very young are expected to lace up their own skates or put on their own skis.

The Finns enjoy one of the highest standards of living in the world, but they, too, worry about falling behind in the shifting global economy. They rely on electronics and telecommunications companies, such as Finnish cellphone giant Nokia, along with forest-products and mining industries for jobs. Some educators say Finland needs to fast-track its brightest students the way the U.S. does, with gifted programs aimed at producing more go-getters. Parents also are getting pushier about special attention for their children, says Tapio Erma, principal of the suburban Olari School. "We are more and more aware of American-style parents," he says.

Mr. Erma's school is a showcase campus. Last summer, at a conference in Peru, he spoke about adopting Finnish teaching methods. During a recent afternoon in one of his school's advanced math courses, a high-school boy fell asleep at his desk. The teacher didn't disturb him, instead calling on others. While napping in class isn't condoned, Mr. Erma says, "We just have to accept the fact that they're kids and they're learning how to live."

Write to Ellen Gamerman at ellen.gamerman@wsj.com