Friday, October 05, 2007

Professores auxiliares

Professores auxiliares

Público, 5 de Outubro de 2007

Sou professora (titular, ora
essa) numa escola deste país
que, para além de ter uma sala
com um quadro interactivo e
alguns computadores portáteis
do maravilhoso programa de
modernização tecnológica do
parque escolar, também tem umas
escadas assassinas. Todos os anos
cai lá alguém. Este ano, caí eu
(...), que já estou no grupo etário
dos sessenta (...). Acompanhada
por uma funcionária lá fui ao
hospital, de táxi. A minha simpática
acompanhante foi para a fi la do
guichet das urgências inscreverme
e, quatro horas depois, com
o diagnóstico de entorse de tipo
2, incapacidade temporária
absoluta por cerca de três semanas
registados por escrito no Boletim de
Acompanhamento Médico – Anexo
II, duas canadianas e com ajuda de
terceiros e de um táxi, lá vim para
casa.
Telefonei para a minha escola
para informar o conselho executivo
(CE) da situação e fui também
informada que devia mandar
entregar uma cópia do tal Boletim
de Acompanhamento Médico
– Anexo II o mais breve possível.
Este impresso é o utilizado quando
alguém tem um acidente no local
de trabalho. (...) No entanto, não
serve para provar a incapacidade
e/ou a doença. Para tal, tem de se
apresentar um atestado passado
pelo médico de família.
De perna esticada no sofá,
telefonei então para o centro de
saúde da minha área de residência,
onde fui uma única vez para me
inscrever e me ser atribuído um
médico de família, o que nunca
aconteceu, por não haver mais
médicos de família. A senhora que
me atendeu explicou-me, não muito
simpaticamente, que deveria estar
no centro um bocado antes das
8h para apanhar a senha para ser
observada pelo médico substituto.
(...) Perguntei se não havia médico
para visitas domiciliárias… Claro
que não, foi a resposta. Agradeci a
gentileza e desliguei.
Resolvi então telefonar para
o Ministério da Educação na
tentativa de perceber como é
que, nas minhas condições, podia
justifi car, nos cinco dias úteis que
a lei prevê, as minhas faltas. Liguei
para a DGRHE (Direcção-Geral dos
Recursos Humanos da Educação)
(...). Voltei a expor o assunto e, sem
hesitações, o senhor responsável
diz-me que compreende
perfeitamente o meu problema e
que o serviço tem recebido mais
telefonemas do género, mas que
a lei é a lei e, quanto a isso, não se
pode fazer nada…
Insisto e pergunto-lhe se tem
alguma lógica eu chamar uma
ambulância para me levar a um
centro de saúde para que um
médico que nunca me viu ateste
da minha incapacidade. Diz-me
que afi nal não preciso de ir. Posso
“passar uma procuração a alguém”
(foi mesmo isto que ele disse), que
vai ao centro de saúde por mim,
tira a senhazita e fi ca à espera três
ou quatro horas que chegue a sua
vez para que o médico substituto
olhe para o papel do hospital e
escreva noutro papel que eu estou
incapacitada para trabalhar durante
três semanas… Argumentei que, se
pedisse a “alguém” para me fazer
esse favor, iria transferir o meu
problema para esse “alguém”, (...)
que, por sua vez, iria ver-se afl ito
para justifi car a própria falta. O meu
interlocutor pensou dois segundos
e voltou a dizer-me que a lei era a
lei (...), mas… Ainda podia haver
outra solução. Era ir a um hospital
privado (disse o nome de um) que
tivesse acordo com a ADSE e que lá
“também passavam atestados” por
interposta pessoa, (...) em horários
mais cómodos e sem fi las de espera,
tipo ao fi m da tarde…
Meio espantada, meio indignada,
continuei a argumentar e a dizer
que não ia obrigar ninguém a
resolver-me este tipo de problema
e que, sendo assim, não justifi caria
as faltas. Que me instaurassem um
processo disciplinar que talvez fosse
a única forma de demonstrar a total
incoerência desta legislação. Acho
que comovi o senhor responsável
pelo serviço que me disse ser
possível o CE da minha escola
aceitar o atestado do médico de
família fora de prazo, isto é, quando
eu pudesse andar para ir ao centro
de saúde. Daqui a três semanas…
Simplex, não é?
Uma professora devidamente
identifi cada

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