Helena Matos
Público 24 Dez 2007
Tornou-se um lugarcomum
afi rmar que
as crianças recebem
prendas a mais. E
entre aquilo que está a
mais contam-se inevitavelmente
os brinquedos tecnológicos.
Contudo, o desperdício natalício
com as criancinhas não é nada
quando comparado com aquilo
que o Estado português gasta nuns
brinquedos tecnológicos que,
tal como os jogos didácticos que
as madrinhas fazem questão de
oferecer, são supostos desenvolvernos
ludicamente o intelecto.
No rol das prendas
governamentais para os cidadãos
as caixas de correio electrónico são
um item obrigatório. No ano 2000,
o então primeiro-ministro António
Guterres prometeu um “mail para
todos” e num ápice foi criado o
Megamail. Do milhão de caixas
anunciadas apenas uma pequena
parte foi activada e o serviço que
o então ministro da Ciência e
Tecnologia, Mariano Gago, definira
como “ímpar” foi morrendo por
falta de utilizadores. Afinal não só
o Megamail funcionava mal como
sobretudo não fazia falta alguma:
os cidadãos já tinham então caixas
de correio electrónico alojadas em
endereços que funcionavam muito
melhor. Quando se julgaria que esta
infausta experiência levaria a que
se abandonasse a ideia, eis que, em
2005, se percebe que o executivo
olhou para a gaveta das ideias
dispendiosa e disparatadamente
inúteis e volta a teimar em
oferecer-nos uma caixa de correio
electrónico: o “mail para todos”
deu lugar ao “e-mail por cidadão”,
o milhão de caixas passou a dez
milhões, o Megamail passou a
ViaCTT. O entusiasmo do primeiro ministro,
que já não é Guterres mas
sim Sócrates, esse é que imutável:
o ViaCTT, garante Sócrates, é
“um projecto emblemático” do
Plano Tecnológico que procura
garantir a “universalidade” e a
“democratização das tecnologias
de informação”.
Tal como em 2000, se
algo é perfeitamente
acessível aos portugueses
são as caixas de correio
electrónico. Daí que os
dez milhões de caixas de correio
oferecidas pelo Governo e pagas
por todos nós pairem no universo
on-line virtualmente vazias. (E
por lá fi carão, a não ser que as
sucessivas criações do Plano
Tecnológico, como o Sistema de
Queixa Electrónica, nos obriguem
a ter uma.) Tenho, contudo,
de reconhecer que estas caixas
de correio electrónico que o
Governo teima em nos oferecer, à
parte o ninguém precisar delas e
terem representado um absoluto
desperdício, não nos atrapalham
grandemente a vida. O mesmo não
se pode dizer duns trambolhos
que dão pelo nome de quiosque
Infocid, outrora conhecidos como
“janela única da Administração
Pública” ou “um espaço de
importância transcendental para a
administração pública portuguesa
que fará ganhar o país”. As
defi nições são naturalmente de
António Guterres cujos governos
foram férteis em janelas que
abriam para pântanos e promessas
de radiosos amanhãs tecnológicos.
O Infocid deve ser mesmo
um ponto de comunicação
transcendental e de ligação ao
oculto, pois nenhum cidadão
comum consegue que eles
funcionem. Hoje a sua única função
conhecida é atravancar os passeios.
No blogue Sorumbático,
oferecem-se almoços
de lagosta e notas
de 50 euros a quem
encontrar um Infocid
que funcione. Até hoje a lagosta
continua traquilamente vivinha
e as notas dormem na carteira.
Caso o leitor encontre um Infocid
a funcionar, ainda vai a tempo
de ganhar a prenda. E aproveite
o entusiasmo para começar
a coleccionar exemplos do
desrazoamento governamental
na hora de nos oferecer prendas.
Quando os governos resolvem
brincar ao Pai Natal, nem as renas
nos salvam dos trambolhos.
O Infocid deve ser mesmo
um ponto de comunicação
transcendental e de ligação
ao oculto, pois nenhum
cidadão comum consegue
que eles funcionem. Hoje a
sua única função conhecida
é atravancar os passeios.
Monday, December 24, 2007
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