Sunday, February 03, 2008

A ministra criacionista

Sábado, 2 de Fevereiro de 2008

A ministra criacionista


Maria Osmarina Marina Silva de Sousa Vaz de Lima, mais conhecida por Marina Silva, é a ministra do Meio Ambiente do país cujo acordo ortográfico com Portugal se discute no De Rerum Natura. Marina Silva é igualmente missionária da igreja adventista Assembleia de Deus desde 2004 e, na altura em que a análise dos últimos dados por satélite revelou uma aceleração no ritmo de destruição da Amazónia, revelou que os problemas ambientais com que o mundo se debate se devem ao facto de a humanidade, nomeadamente os que professam as restantes confissões cristãs, não a emularem na leitura da Bíblia como um manual de ecologia.

Segundo a revista Época, certamente para a auxiliar na interpretação ecológica da Bíblia, «Na gestão de Marina, ela contratou o pastor Roberto Firmo Vieira, da Assembléia de Deus, como consultor do ministério, por intermédio de um contrato mantido com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Segundo o site Eco, Vieira usa a estrutura do ministério para cultos, alguns com a presença da ministra».

Claro que o pequeno pormenor de o Brasil ser, supostamente, um estado laico é um detalhe de somenos importância face ao desvio brasileiro em relação às prescrições ecológicas «muito detalhadas» da Bíblia que recomenda, como recordou a ministra, «não matar a ave que está no ninho com filhote» e «não destruir a floresta» quando se destrói a cidade (e respectivos habitantes) que circunda.

A ministra fez tão iluminadas afirmações no Centro Universitário Adventista de São Paulo ao vivo e a cores (e com direito a webcast) no 3º Simpósio Criacionismo e Mídia em que defendeu a inclusão nos curricula brasileiros de ciência do criacionismo - versão terra jovem, fiel à «visão» da criadora da seita (sem sentido pejorativo, claro) a que pertence, Ellen Gould White, e traduzida em livro pelo autodidacta George McCready Price.

Na Folha de São Paulo, Sandro de Souza, director do Laboratório de Biologia Computacional do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, em São Paulo, refere em relação ao fortalecimento das investidas criacionistas neste país, despoletadas essencialmente por grupos evangélicos, que «Apesar de esses grupos estarem se fortalecendo politicamente no Brasil, principalmente representados pelos evangélicos, sua influência também deve ser creditada ao vácuo gerado pela falta de um debate consistente sobre as limitações do criacionismo como ciência, cuja iniciativa deveria partir da comunidade científica brasileira. Assumir esta responsabilidade é particularmente crítico em um país como o Brasil, onde algo como o debate criacionismo X evolucionismo pode ser visto como supérfluo em face aos outros problemas no nosso sistema educacional».

Espero que Sandro de Souza não considere abusiva a minha firme convicção de que a responsabilidade que assaca à comunidade científica brasileira deve ser estendida a toda a comunidade científica em geral e à de língua portuguesa em particular - não obstante as diferentes grafias que para alguns são impeditivas da livre circulação de ideias escritas nos dois lados do Atlântico. Na realidade, sabendo que muitos brasileiros, que são neste momento quase um quarto dos nossos leitores, acedem ao De Rerum Natura, especialmente a posts sobre criacionismo, diria que mesmo sem uniformização na utilização de acentos ou de consoantes mudas, cumprimos e cumpriremos a nossa responsabilidade nesta matéria, por muito que tal assunção desagrade a alguns dos nossos leitores.

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