Saturday, February 23, 2008

Vou contar pela primeira vez um episódio que esteve na génese do processo de avaliação de desempenho dos professores

Quinta-feira, 7 de Fevereiro de 2008

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Barcelona 20


Vou contar pela primeira vez um episódio que esteve na génese do processo de avaliação de desempenho dos professores. O secretário de estado, Valter Lemos, que eu conheço desde os tempos em que estudámos juntos na Boston University, já lá vão 24 anos, pediu-me para reunir com ele com o objectivo de o aconselhar nesta matéria. Tenho de confessar que fiquei admirado com o conhecimento profundo e rigoroso que Valter Lemos mostrou ter da estrutura e da organização do sistema educativo português. Enquanto estudante, habituara-me a ver em Valter Lemos um aluno brilhante e extremamente trabalhador, qualidades que mantém passados tantos anos. No início, fui um entusiasta da avaliação de desempenho dos professores pois considerava que manter o status quo era injusto para os professores mais dedicados e competentes. Nessa altura, eu encarava a avaliação dos professores como um factor de diferenciação que pudesse premiar os melhores e incentivar os menos competentes a melhorarem o seu desempenho. Fiz algumas reuniões de trabalho com a equipa técnica do ME e logo me apercebi de que a Ministra da Educação estava a engendrar um processo altamente burocrático, subjectivo, injusto e complexo de avaliação do desempenho que tinha como principal objectivo domesticar a classe e forçar a estagnação profissional de dois terços dos docentes. Ao fim de duas reuniões, abandonei o grupo de trabalho porque antecipava o desastre que estava a ser criado. Nas reuniões que eu tive com a equipa técnica do ME, defendi a criação de fichas simples, com itens objectivos, sem a obrigatoriedade da assistência a aulas, a não ser para os casos de professores com risco de terem um Irregular ou um Regular, e com um espaçamento de três anos entre cada avaliação. Hoje, passados três anos, considero que se perdeu uma oportunidade de ouro para criar uma avaliação de desempemho dos professores realmente objectiva, justa, simples e equilibrada. Em vez disso, criou-se um monstro que vai consumir milhões de horas de trabalho nas escolas e infernizar a vida de muitos professores, roubando-lhes a motivação e a energia para a relação pedagógica e a preparação das aulas.

Thursday, February 21, 2008

De quem é a escola pública?

De quem é a escola pública?

Ana Benavente – 20080221, Público

Qualidade e equidade são duas faces da mesma moeda. Nem uma nem outra são contempladas na actual política educativa.

1.As escolas públicas portuguesas estão a viver difíceis e (quanto a mim) perigosos momentos. Peça a peça, uma legislação fragmentada e sob forma de decretos-leis (e, portanto, sem debate nem sequer na Assembleia da República) está a criar um puzzle de que já se adivinha o resultado final: uma escola centralizada e burocrática, sem autonomia e cega à diversidade social, centrada nas percentagens estatísticas, destruidora da profissão docente. Os professores têm medo, os sindicatos encurralaram-se nas suas impotências, o Governo acha que é dono das escolas e capataz dos professores.
Como instituição social, a escola não pertence a nenhum governo mas sim ao país, a todos os parceiros, a todos os que nela vivem e a todos os que dela esperam, legitimamente, um importante contributo positivo para a educação e formação das gerações mais novas.
2. Sei que é difícil qualquer debate de fundo sobre a escola, o seu presente e o seu futuro; é uma das questões mais fortemente enviezadas por quase todos aqueles que, tendo no passado sido os seus "eleitos" (a minoria de alunos que aprenderam e se "formaram"), são os que hoje escrevem e falam sobre a escola, sempre virados para uma fictícia "idade de ouro", algures num passado perdido que gostariam de ver reaparecer. Em geral, os que mais escrevem e falam não têm qualquer ideia sobre o que é hoje uma escola pública, com uma escolaridade obrigatória alargada, num tempo de tecnologias e num mundo multicultural. O tempo não volta para trás.
3. A OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico) tem desenvolvido, há mais de dez anos, uma série de trabalhos sobre "A Escola de amanhã"; pretende a OCDE traçar cenários, a partir das tendências actuais assim como do que é "desejável" e "provável", de modo a que saibamos que caminho queremos percorrer e possamos, então, decidir os passos a dar.
Que queremos? "Recriar" a escola do passado correndo o risco de as escolas se tornarem ingovernáveis? Manter o que herdámos com alguns acrescentos e remendos? Abandonar a escola (cara e pouco rentável) e promover o "cheque-educação" e outras medidas num mercado livre em que o saber se vende e se compra e o Estado deixa de assumir a responsabilidade da educação para todos como bem pessoal e social?
Ou queremos re-fundar a escola que herdámos, melhorá-la e adequá-la a novas exigências, libertando-a dos jugos centralistas, percebendo que "igual para todos, da mesma maneira e ao mesmo tempo" gera mais desigualdade e que a equidade e a exigência não se constroem com mais repetências, expulsões e controlos burocráticos?
4. Os últimos dois diplomas governamentais, um dos quais já em vigor, são peças decisivos deste puzzle perverso. O diploma relativo à avaliação dos professores quer avaliá-los um a um observando as suas aulas. Com "quotas" para excelente, bom e por aí fora. E quem avalia? Colegas (os ditos "titulares") muitas vezes com menos saberes e experiência que os avaliados. Esses "avaliadores" reportam à inspecção (ou deveriam reportar, dado que a inspecção desapareceu misteriosamente no último documento que chegou às escolas). Embora sem regulamentação conhecida, o diploma "é para já". E já quer dizer a meio do ano, sem se terem previamente estabelecido objectivos, metas ou critérios.
Está criado o caldo da desconfiança, da competição e das invejas. A escola, centro da vida educativa, lugar de equipas docentes que asseguram aprendizagens, torna-se numa repartição da 5 de Outubro. Sabiam, por exemplo, que na avaliação de quem passou ou não a professor titular (casta de que se desconhece a origem e o destino) foram penalizados todos aqueles que deram faltas por doenças devidamente comprovadas? E por isso as escolas estão à beira de um ataque de nervos; os professores mais velhos querem reformar-se, os mais novos angustiam-se com os "maremotos" legislativos.
Quanto ao diploma relativo à organização e gestão das escolas, cujo período de debate "público" termina a 8/2/08, a situação é porventura ainda pior. Escolhe-se um director, que, por sua vez, escolhe todos os responsáveis de todos os cargos das escolas. Organizar as escolas assim para quê? Com que objectivos? Qualquer um de nós sabe que, tanto individualmente como em grupo, primeiro decidimos o que queremos fazer e só depois nos organizamos para o fazer. Ou não será assim?
5. A questão é séria: queremos uma escola pública com qualidade e equidade? Queremos que esse serviço seja assumido pelo Estado democrático? Ou queremos que o saber se venda e se compre como outro bem qualquer?
Eu quero uma escola pública forte, pois só assim ela pode contribuir para atenuar as desigualdades sociais e assegurar a todos, qualquer que seja o seu lugar de nascimento e o seu meio social, a apropriação do saber e do conhecimento que são património de todos nós e não apenas de alguns. As tentativas de retorno ao passado estão condenadas (OCDE dixit) e a mercantilização reforçará fortemente as desigualdades sociais.
6. Qualidade e equidade são duas faces da mesma moeda. Nem uma nem outra são contempladas na actual política educativa. Voltando aos cenários da OCDE, vejo, no fim deste puzzle, uma mistura de tentativa de retorno ao passado e de mercantilização de actividades educativas (que já começou, dos tempos livres ao inglês, por exemplo).
É isso que realmente queremos?

Professora universitária


Saturday, February 16, 2008

Lesson one: no Orwellian language

Last Updated: Saturday, 16 February 2008, 00:19 GMT
Lesson one: no Orwellian language
By Mike Baker

Mike Baker
An insightful speaker raised a massive cheer from the audience at an education conference this week.

No, he had not called for a doubling of teachers' pay, the abolition of national tests, or even a ban on lumpy custard in school canteens.

No, his rallying cry was much simpler and involves no complex administrative changes or financial costs.

Yet it went to the heart of what education is about.

He urged everyone to stop talking about "delivery" in education and to return to talking about "teaching".

The speaker was Professor Richard Pring, of Oxford University, and he was not just being fussy about the use of language.

A quick look at any recent government documents quickly provides further examples

His point was that education has been taken over by an "Orwellian language" which has started to control the way we think and act.

Professor Pring is the lead author of a report, published this week by the Nuffield Review of 14-19 Education and Training, which looks at how the aims and values of education have come to be "dominated by the language of management".

So when judging schools and universities we now talk about "performance indicators" as a substitute for assessing the quality of their teaching.

Learning has to be measured by an "audit" of the qualifications achieved rather than a more qualitative judgement of what students have learned.

This approach has certainly driven policy in adult education, where courses that do not lead to an accredited qualification seem to be dismissed as mere hobbies by policy-makers.

A quick look at any recent government documents quickly provides further examples.

For example, they talk about "new providers" instead of schools.

'What is education for?'

Repeated phrases refer to "efficiency gains", "choice for customers", "the market", and "funding systems that respond to customer demand".

The phraseology of "inputs" and "outputs" is more like the language of industrial production than of education.

It implies there is an exact specification for the finished product.

The Nuffield paper wonders whether we have lost sight of earlier descriptions of education such as "the conversation between the generations of mankind" (Michael Oakeshott) or an introduction to "the best that has been thought and said" (Matthew Arnold)?

I suppose this could seem unfair. After all, the authors of government documents are not attempting to do the same thing as philosophers of education.

Yet this matters because the language we use shapes the answers to the question: "what is education for?"

And there is no doubt that it is the model of workforce preparation and employability that currently dominates the current education discourse.

Hence we now have "enterprise" as a compulsory part of the school curriculum, while history, geography and foreign languages are no longer required after the age of 14.

'Bigger picture'

Nor is this simply about a neglect of certain types of traditional academic learning.

Equally overlooked is the value of practical, hands-on learning or of creativity.

Yes, we are about to get new Diplomas in vocation subjects such as engineering, IT, Creative and Media and Health and Beauty.

But the government does not describe these as vocational qualifications but prefers to describe them as "academic" qualifications and to stress their A-level equivalence.

This may make practical sense in the face of British snobbery towards non-academic qualifications.

But it also suggests a lack of confidence in the value of practical education.

'Academic frippery'

The need to measure everything and to find equivalents for different types of education arises from a natural enough desire to achieve value-for-money, and to promote different routes for young people.

But it can also be a strait-jacket, implying that all types of learning can, and should, be forced into the same model.

As Professor Pring pointed out, one of the problems with the General National Vocational Qualifications (GNVQs) - and a future risk for Diplomas - is that in an attempt to achieve parity with GCSEs and A-levels, students were assessed not so much on what they could "do" but how well they could write about and analyse their "doing".

Students were forced into a model of academic learning, even when they had chosen something that had a hands-on and practical approach.

The same applies to creativity; the latest government initiative is an investigation into how to measure the levels of creativity amongst school pupils.

The Nuffield Review paper concludes that we should recognise, and value, many different aims for education.

These include: critical thinking and an introduction to knowledge in the physical and social sciences, the humanities and the arts; development of practical capabilities; preparation for citizenship; and development of the ideals and values needed to face the big issues affecting our communities.

Taking us back to consider the big question - "what is education for?" - may seem like an academic frippery compared to the day-to-day hard questions about the curriculum and testing.

But at a time when 14-19 education in England is going through its biggest upheaval for over 50 years, it is an essential reminder of the need to keep an eye on the bigger picture.

Wednesday, February 06, 2008

School modernisation slips again

Tuesday, 5 February 2008, 17:30 GMT

School modernisation slips again
Gordon Brown opening Bristol's Brunel Academy
Bristol's Brunel Academy was the first to open
A £45bn government scheme to modernise England's secondary schools has fallen further behind target, MPs have heard.

Originally work on 100 schools under the Building Schools for the Future (BSF) programme was due to be completed by now, but only nine are open.

Recently the government said a dozen would have been done by 2007-08, then another 50 next year.

Now schools minister Jim Knight has said in a Commons written answer that only 35 will be ready next year.

In response to a query from a Labour MP, Mr Knight said that the programme was progressing well.

The first BSF school, Bristol Brunel Academy, had been opened by the prime minister last September.

"Local authorities plans show that we expect 12 new schools to be open by December 2008, 35 more in 2008-09, 115 more in 2009-10, 165 more in 2010-11, and then around 200 a year and rising thereafter," said Mr Knight.

However, the last time the government was asked about this, in October, Mr Knight had given the figure of 50 more for 2008-09.

'Billions spent'

The shadow schools secretary, Michael Gove, said the initial target had been to rebuild or refurbish every school - there are about 3,500 - by 2015.

"The government's school building programme is in danger of descending into chaos," he said.

Ministers did not seem able to handle a project of this magnitude. Billions of pounds were being spent but parents and children were not seeing the results, he went on.

"It is of little surprise that, as with other failures, they have tried to bury this bad news, in this case by trying to hide it in an obscure written answer to a patsy question from a Labour MP on the government payroll."

The Partnerships for Schools organisation which runs the BSF programme has proposed savings of up to £250m and a streamlining of the procurement process.

There will be fewer sample schemes and more emphasis on producing the highest-quality designs for new schools.

Key recommendations include cutting the overall procurement time from 82 weeks to 75, and selecting two lead bidders after 29 weeks rather than 44.

The proposals are expected to be considered by ministers later this month.

'Devil in detail'

Chief executive Tim Byles said: "It is widely accepted that delivery of the BSF programme has picked up pace considerably over the past year.

"A package of measures designed to ensure that local authorities are ready to hit the ground running as soon as they enter the programme has already made a real difference to the timetable for delivery."

The director of the British Council for School Environments, Ty Goddard, said: "These preliminary findings are, we hope, a genuine attempt to answer major disquiet over the present BSF procurement process around such issues as duplication, achieving value for money and the translation of educational vision into reality."

But he added: "Today's announcement doesn't represent the root and branch changes we called for.

"The devil is, as always, in the detail, and the focus must be on real change for all those involved in the procurement process in the future."

The scheme was first announced by Gordon Brown when he was Chancellor in his Budget in 2004.

He said: "Our capital investment allocations will ensure for every constituency in the country that by 2015 every secondary school can be refurbished or rebuilt with world class technology in every school and the best state-of-the-art learning support in every classroom."

This was later downgraded to major remodelling of "at least three" schools starting in every local authority by 2016.

Tuesday, February 05, 2008

Excerto do “Pequeno guia para uso dos trabalhadores durante a marcha gloriosa das vitórias da produtividade”

Excerto do “Pequeno guia para uso dos trabalhadores durante a marcha gloriosa das vitórias da produtividade”

Dicionário de newspeak empresarial

José Victor Malheiros, Público 5 Fev 2008

O bem-estar dos trabalhadores é importante
para nós: Vamos instalar vending
machines no hall para não terem desculpas
para ir ao café.
A segurança dos nossos trabalhadores
é uma prioridade: Se essa porta não estivesse fechada
vocês passavam o dia todo na rua a fumar.
A mobilidade é um imperativo da produtividade:
Devemos ir para onde a mão-de-obra seja mais barata.
A deslocalização é um imperativo logístico: Os albaneses
trabalham mais barato que vocês e fi cam mesmo
ao pé de Itália.
Na era da Internet a localização geográfi ca de uma
empresa é irrelevante: Os chineses ainda trabalham
mais barato que os albaneses.
Nesta empresa, o mais importante são as pessoas:
Custa-me imenso despedi-los a todos.
Precisamos de libertar uma parte da nossa mão-
-de-obra: Vamos despedir 200 tipos.
Precisamos de reduzir os custos fi xos: Vamos despedir
200 tipos.
Temos de apostar na fl exibilidade: Vamos despedir
200 tipos e contratar uns brasileiros a recibo verde.
As promoções têm de ser fruto do mérito: As mulheres
que engravidem podem esquecer a promoção.
Os imigrantes têm óptima formação e forte espírito
de equipa: Como os ucranianos não estão legalizados
não podem apresentar queixa.
Precisamos de apostar no outsourcing: Não temos
dinheiro para pagar aos nossos técnicos.
Precisamos de vestir a camisola: Este ano não vai
haver aumentos.
O esforço de reengenharia está apenas a dar os
primeiros passos: Ainda não sabemos quantos empregados
vamos despedir.
Vamos iniciar um processo profundo de reestruturação:
É provável que sejam quase todos despedidos.
Estamos a encarar a possibilidade de downsizing
nalguns sectores: A única maneira de continuarmos a
ter dinheiro para pagar os salários dos gestores é fazer
alguns despedimentos.
Precisamos de sangue novo: Como é que se chama
aquela rapariga de mini-saia e óculos vermelhos que estava
a sorrir para mim?
Temos uma forte consciência do papel social da
nossa empresa: Estamos a tentar obter uns subsídios.
Precisamos de ideias novas: Vamos despedir as pessoas
com os salários mais altos...
Precisamos de renovar a lógica de organização da
empresa: Vamos mudar o nome dos departamentos.
Estamos a repensar a missão da empresa: Pagámos
uma fortuna a uns consultores para desenhar um novo
logótipo.
Devíamos fazer um brain storming: Não faço ideia.
Estou só a lançar ideias para cima da mesa: Não
li o dossier.
Temos de pensar out of the box: Alguém tem uma
ideia?
Temos de repensar o nosso core business: Tecnicamente
estamos na falência.
Precisamos de aumentar o share of mind da nossa
empresa: Ninguém sabe que nós existimos.
Fizemos um realinhamento estratégico: Pagámos
uma fortuna a uns consultores que nos provaram que
os consultores anteriores a quem tínhamos pago uma
fortuna se tinham enganado redondamente.

Sunday, February 03, 2008

A ministra criacionista

Sábado, 2 de Fevereiro de 2008

A ministra criacionista


Maria Osmarina Marina Silva de Sousa Vaz de Lima, mais conhecida por Marina Silva, é a ministra do Meio Ambiente do país cujo acordo ortográfico com Portugal se discute no De Rerum Natura. Marina Silva é igualmente missionária da igreja adventista Assembleia de Deus desde 2004 e, na altura em que a análise dos últimos dados por satélite revelou uma aceleração no ritmo de destruição da Amazónia, revelou que os problemas ambientais com que o mundo se debate se devem ao facto de a humanidade, nomeadamente os que professam as restantes confissões cristãs, não a emularem na leitura da Bíblia como um manual de ecologia.

Segundo a revista Época, certamente para a auxiliar na interpretação ecológica da Bíblia, «Na gestão de Marina, ela contratou o pastor Roberto Firmo Vieira, da Assembléia de Deus, como consultor do ministério, por intermédio de um contrato mantido com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Segundo o site Eco, Vieira usa a estrutura do ministério para cultos, alguns com a presença da ministra».

Claro que o pequeno pormenor de o Brasil ser, supostamente, um estado laico é um detalhe de somenos importância face ao desvio brasileiro em relação às prescrições ecológicas «muito detalhadas» da Bíblia que recomenda, como recordou a ministra, «não matar a ave que está no ninho com filhote» e «não destruir a floresta» quando se destrói a cidade (e respectivos habitantes) que circunda.

A ministra fez tão iluminadas afirmações no Centro Universitário Adventista de São Paulo ao vivo e a cores (e com direito a webcast) no 3º Simpósio Criacionismo e Mídia em que defendeu a inclusão nos curricula brasileiros de ciência do criacionismo - versão terra jovem, fiel à «visão» da criadora da seita (sem sentido pejorativo, claro) a que pertence, Ellen Gould White, e traduzida em livro pelo autodidacta George McCready Price.

Na Folha de São Paulo, Sandro de Souza, director do Laboratório de Biologia Computacional do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, em São Paulo, refere em relação ao fortalecimento das investidas criacionistas neste país, despoletadas essencialmente por grupos evangélicos, que «Apesar de esses grupos estarem se fortalecendo politicamente no Brasil, principalmente representados pelos evangélicos, sua influência também deve ser creditada ao vácuo gerado pela falta de um debate consistente sobre as limitações do criacionismo como ciência, cuja iniciativa deveria partir da comunidade científica brasileira. Assumir esta responsabilidade é particularmente crítico em um país como o Brasil, onde algo como o debate criacionismo X evolucionismo pode ser visto como supérfluo em face aos outros problemas no nosso sistema educacional».

Espero que Sandro de Souza não considere abusiva a minha firme convicção de que a responsabilidade que assaca à comunidade científica brasileira deve ser estendida a toda a comunidade científica em geral e à de língua portuguesa em particular - não obstante as diferentes grafias que para alguns são impeditivas da livre circulação de ideias escritas nos dois lados do Atlântico. Na realidade, sabendo que muitos brasileiros, que são neste momento quase um quarto dos nossos leitores, acedem ao De Rerum Natura, especialmente a posts sobre criacionismo, diria que mesmo sem uniformização na utilização de acentos ou de consoantes mudas, cumprimos e cumpriremos a nossa responsabilidade nesta matéria, por muito que tal assunção desagrade a alguns dos nossos leitores.